Não dá vontade de sair da cama nesses dias incomuns, nem há lareiras em minha casa, nem edredons, só há esse gosto doce das lembranças e a vontade de deixar para mudar o mundo amanhã, com o dia mais aquecido. Os dias de frio costumam ser melancólicos, e solitários, dá até pra sentir saudade do que ainda nem se viveu e talvez não viva. É no frio que a percepção de que o tempo passou fica mais forte, mais triste e mais bela. Olhamos no espelho e não vemos nada além de uma face que o tempo modificou, e se percebe que a beleza ainda está ali, porém as dores nunca voltarão a ter o mesmo efeito. A luz do dia, entrando pelas janelas chega até a ser poética, a chuva ou a prenuncia dela tem dessas coisas, nos faz lembrar dos beijos lindos e românticos, dos sorrisos inocentes, do tempo em que a boêmia não combinava com a perda e os corações acreditavam em contos de fada. Para os adultos um dia de frio é saudade e esperança, parece que antes do calor voltar o príncipe encantado vai aparecer, as canções belas vão fazer chorar, os namorados nas praças vão ser notícia de TV e vai cair do céu junto com a chuva ou com o vento frio os sonhos insuperáveis e isso tudo vai acontecer enquanto você dorme ou ler um livro deitado na cama cheia de lembranças de um amor que não está mais ali. O frio vai passar, talvez naquele mesmo dia, talvez em outro, mas vai passar. E o que permanece é a saudade da saudade, a vontade da vontade, a esperança da esperança de um dia de frio possibilitar um século de calor.
Tiara Sousa