terça-feira, 25 de novembro de 2008

Sentimentos

As pessoas sentem, não porque sentir é bom ou é ruim, não porque sentir dá medo ou dá coragem. As pessoas sentem, porque sentir é natural e extravagante e acontece como o ar invadindo os pulmões, sem medidas e sem avisos. São tantos os sentimentos de um ser humano, que às vezes dá até pra confundir, não sabe-se mas o que é real ou imaginação, o que é desejo ou capricho, o que é abstrato ou próprio, o que é maravilhoso ou abominável, o que é sentimento.
Tem pessoas agora sentindo saudades, tem pessoas sentindo vergonha, pessoas extremamente apaixonadas, pessoas com raiva, pessoas confusas, só não há no mundo, do começo ao fim, alguém sem sentimentos.
Cada planta, cada bicho, cada luxo, cada vez, cada hora, cada sorriso, cada choro, cada um, sentem, e sentem mais, e quando não agüentam mais sentir, sentem um pouco mais, são dos sentimentos que vem o caráter, são dos sentimentos que vem os desejos, são dos sentimentos que vem os fantasmas, as lutas, a arte, tudo que o brilho da Lua não ofusca, e a luz do Sol não pode apagar.
Nunca deve-se nomear um sentimento de imaturo, maturidade é coisa pra quem sente pouco, pra quem sente mal, sentimentos são do dia a dia e da vida inteira. É preciso sentir pra escrever, é preciso sentir para pintar, é preciso sentir pra namorar, e antes de tudo é necessário sentir, e sente-se, por que sentindo tudo é vida, tudo cheira, tudo dói, tudo encanta e comove. Sentimento é coisa de gente, de bicho, de natureza, de verdades.

Tiara Sousa

segunda-feira, 17 de novembro de 2008

Laila, a Quarta

( Dedicada a minha irmã, Laila Cunha Santos)

Laila, a Quarta

De todos os tímidos, ela se fez maior
Impecável, possibilitou o dia seguinte
A teimosia, a eficaz, a diferença, a genética, o exótico
Laila não soube sorrir, quando era pra chorar
O medo ou a dor de que se faz ausente
Daquele que prevê um mundo

Não inconstante, ela sobreviveu
Entre paixões e clausura
Entre pessoas e olhares
Que reprovam, que condenam
Que lutam, que choram
E aprendem que o amanhã
É sempre insano, é sempre mistério

Laila aprendeu a fugir e a encontrar
Aprendeu que a poesia não é coisa de gente feliz
Ela quis mudar!
Mas ninguém muda
Ninguém atende ansiosamente a telefonemas pelos quais não esperou

Menina! Ainda não sabe
Que as comédias românticas americanas
Não são reais
Que as lutas não são em vão
Que toda paixão parece ser o grande amor de uma vida
E quase sempre não é!

Atrás da fatal e atraente “normalidade”
Pensou em ser moralista
Não conseguiu.
Pensou em ser objetiva
E escreveu poesia!
Pensou mesmo em ser
Só Laila...
Mas ser só Laila
É enlouquecer ou carregar consigo todas as dores da humanidade
Então por fim, pensou em ser má.
Mas maldade não entra em coração de POETA


Tiara Sousa

terça-feira, 28 de outubro de 2008

Agora Foi

Exatamente como não deveria ser, foi “Agora Foi”. Numa ilha qualquer, em qualquer direção. Um povo que não ainda não sabe votar, uma gente sem memória, uma elite sem consciência, uma simplicidade sem beleza, uma classe média que só defende seus próprios interesses, uma volta triunfante e abominável e uma direita completamente errada. Doeu, doeu no sonho de crescimento, no embalo de uma esperança, na virtude de um comunista e na falsa democracia, tão falsa que irá dar leite em pó pra enganar a fome, porque a fome vai continuar, e irá falar bonito pra enganar a dor, que irá permanecer, e quantas pessoas terão de adoecer pra um belo hospital acontecer, quantos Castelãos serão preciso pra endividar a cidade, porque uma bela obra chama a atenção e chamar atenção reelege, quantos humildes ficarão desempregados, pra classe média se favorecer, mas como saber, mas como ajudar, mas como mudar, se pra “eles” o interessante é que o povo continue a não saber votar.
A ditadura, o militarismo, o coronelismo, e um belo discurso, uma campanha cara, sem paixão, sem emoção, sem respeito e com dinheiro é claro, muito dinheiro e alianças, por que o povo não quer, precisa, o povo não tem, merece, o povo ludoviscence vai, “agora vai” enxergar a realidade e daqui há uns anos esquecer novamente o que dói, o poder de poder, a ganância, o medo, o mal.
Serão quatro anos, e quantos anos mais, serão quatro longos anos, de guerras disfarçadas de paz.
Tiara Sousa

sexta-feira, 17 de outubro de 2008

Amizades


Amigos são pedaços de nós que encontramos pela vida, ora fácil, ora ferida, horas e dias, dias e meses, meses e anos.
Dos amigos que tenho, guardo comigo todas as faces, pessoas tem defeitos, amigos tem verdades.
Os amantes se despem pra se descobrir, os amigos se despem pra se ajudar e o diferente mora exatamente no sentido de amar.
Quanta nobreza amar alguém que não se é amante, que não se é família, que apenas é, porque sem nenhum interesse banal, incontrolável, o amor é reconhecido pela cumplicidade, mais do que pela entrega, pelo diálogo, mais do que pelo momento, pelo real, mais do que pela fantasia, pelo até logo mais do que pelo adeus.
Toda verdadeira amizade é pura e dura tempo suficiente pra se eternizar dentro de nós.
Ajudar alguém, ser ajudado por alguém, ouvir alguém, ser ouvido por alguém, é mais do que podemos ter, é aquilo que podemos ser.
Amizades são como canções belas, são letras simples, com melodias raras que nos marcam e nos exaltam.
Tiara Sousa

sábado, 29 de março de 2008

Declaração de raça


Declaro para os devidos fins que sou negra, conhecida por alcunha de mulata, termo dado a mistura da raça Negra com a raça Branca, derivado da palavra mula, forma como se tratavam os negros durante a escravidão e como muitos ainda são e se permitem ser tratados.
Declaro também que pelo fato de minha pele ser marrom, meus cabelos crespos cacheados, meus traços fugirem do padrão de beleza ditado pela sociedade, mídia e moda tenho plena autonomia para afirmar que o racismo ainda existe.
Diante de tal relato, afirmo também que esta declaração é prova que não me curvo diante do racismo, que não me julgo inferior, que assumo cada traço do meu rosto e da minha história.
Nos últimos anos, ser racista foi reconhecido como um defeito, se assumir racista é ter complicações com a justiça, que o considerou crime inafiançável, expor um negro a qualquer situação discriminatória é constrangimento infalível e recriminado de qualquer ciclo social, criou-se cotas para negros nas universidades, nos anúncios de emprego disfarçaram a discriminação racial com as palavras boa aparência, tais precauções só vem reforçar que o racismo é muito freqüente, e que os negros precisam da lei para protege-los de ofensas, precisam de cotas para vencer a concorrência desleal e classista nos vestibulares, precisam de escova progressiva para entrarem no quesito boa aparência.
O racismo era notório e designava-se adiante mórbidos ataques de rejeição, incompreensão e exclusão, hoje ele é faceiro, os negros podem entrar nos restaurantes chiques, mas não tem meios de pagar a conta, podem se hospedar em hotéis cinco estrelas, mas não dispõem de verbas para as diárias, podem estudar em boas escolas, mas não tem como pagar as mensalidades, podem aparecer na mídia, mas não podem ser o galã ou a mocinha da novela das nove. Até o conceito de autodiscriminação é racista, a grande massa considera chapinha e plástica no nariz embelezamento, porém diz ser o cúmulo do auto-racismo a paixão inter-racial, como se fosse possível escolher por quem se apaixonar.
O que dita a abominável condição de mais de 70% dos negros na sociedade é a não oportunidade, sem educação de qualidade, caríssima diga-se de passagem, o negro não tem condições financeiras para chegar a altos patamares e cargos, saímos das senzalas e fomos às favelas, precisamos “matar um boi por dia” para sobreviver e vencer a guerra contra o preconceito, que vem de berço, ou melhor, da falta dele.
Não costumo me curvar a estatísticas, pois as mesmas são desanimadoras; A exacerbada maioria, de alunos nas escolas públicas, é de negros, nos empregos assalariados, é de negros, nos bairros de periferia, é de negros, e isto não é demonstração de inferioridade intelectual, pois somos tão inteligentes e capazes quanto pessoas de qualquer raça.
Por fim, declaro que não aceito comentários mórbidos disfarçados pelo preconceito atual de “elogios”, como: “você é menos escura que tal pessoa”, “seu cabelo é melhor do que o de fulano”, “seus traços são mais finos do que o de cicrano”; Pois não defino sequer como elogio qualquer palavra e/ou atitude que menospreze e diminua a minha raça.
Este é o racismo contemporâneo, doença que vem se alastrando pela sociedade, e que todos os cidadãos munidos de conhecimento, dignidade e respeito deveriam combater independente da raça e da cor da pele.
Tiara Sousa

terça-feira, 8 de janeiro de 2008

A história que guardei pra mim

Não irei falar de nenhum romance daqueles estilo conto de fadas, nenhuma fofoca daquelas de dar pano pra manga, nenhum grande segredo, daqueles que deveriam ser guardados pra toda vida e nunca são, é apenas uma história; A história que guardei pra mim.
Era uma vez, (por que “Era uma vez” nunca sai de moda) uma garota que vivia muito humildemente num mundo de fantasias, um mundo somente seu, é que ela era do signo de peixes e os piscianos são mesmo assim, neste mundo havia uma lâmpada mágica que transformava todos os seus desejos em realidade, os bibelôs falavam e viviam como os humanos, se zangavam, se apaixonavam, cantavam, brincavam e sofriam, seu mundo não era de somente felicidade, ela sabia que os encantos viviam na tristeza e que toda solidão possuía uma misteriosa beleza. Ela acreditava no que ninguém acreditava, sereia, mãe-d’água, um mundo mágico no fundo do mar, é que ela considerava o mar a maior beleza natural, na escola diziam que ela vivia no mundo da lua, mas é que o mundo da lua era demasiadamente mais agradável que a Terra e ela espertinha como só, já havia descoberto.
Na Terra ela tinha um cachorrinho que fugiu, uma mãe maravilhosa que trabalhava o dia inteiro, um pai poético que ela nunca via, irmãs felizes que ela não sabia, roupas caras que ela não escolhia, brinquedos lindos sem companhia, vizinhos divertidos que eram distantes, melhores amigos de quem ela não era a melhor amiga, desse mundo a melhor vó e a melhor tia, porém uma imensa nostalgia e um velho disco de Chico Buarque, com que definitivamente tudo aprendia.
Essa garota cresceu cultivando valores como dignidade, honestidade e respeito, mas ainda assim, acreditem, cheia de defeitos, ainda é tão sonhadora que deixou seu outro cachorrinho ficar doente, decepcionou várias vezes sua maravilhosa mãe que continua a trabalhar o dia inteiro, seu pai, ainda poético,ela sempre vê, mas não consegue esquecer que nunca via, as irmãs agora não tão felizes passou a saber, mas pouco as encontra, as roupas ela decide, a escolha é toda sua, não é uma questão preço, é uma questão de bem estar, brinquedos ela deixa com seu filho e suas companhias, vizinhos, não são mais tão divertidos, talvez por também não ser tão distantes, é definitivamente a melhor amiga de seus melhores amigos que ela descobriu a duras penas que são a sua família, desse mundo as melhores ainda são a sua vó e a sua tia, seu bebê não lhe dá tempo pra tal imensa nostalgia, e os CDs de Chico Buarque retratam muito de seu aprendizado e vida.
Eis a história que guardei pra mim.

Tiara Sousa