sábado, 6 de abril de 2013

A irmã que eu não visito


É tão fácil chegar até aquele hospital, é mais fácil do que escrever uma matéria, do que dar uma aula, do que escolher um vestido, do que responder uma prova, do que viver.
É só ir até lá, e entrar, e olhar nos olhos dela por alguns minutos, e sair. É só ir até lá, e entrar, é só ir até lá e ficar, é só ir...
Mas e se os olhos dela não brilharem, o que eu vou fazer com a ausência do brilho? Como eu vou caminhar até a saída e voltar a viver, a ouvir músicas, a ler livros, a assistir TV, como?
Eu não fui preparada pra isso.
E se não saírem palavras da boca dela, e se ela não vir correndo me abraçar como sempre fazia, e se ela não souber mais sorrir, o que eu vou fazer com a falta do sorriso dela? Como é que eu vou sorrir depois disso?
Eu sei que é egoísta pensar assim, mas eu reaprendia a sorrir, enquanto ela desaprendia a ser feliz, e agora eu não tenho mais as ilusões dos 20 anos, eu não tenho mais as fantasias boemias que me entorpeciam, pra onde eu vou correr quando eu sair de lá, daquele hospital? Eu vou ter que aprender tudo novamente.
Eu acordo todos os dias me programando pra ir até lá, pra dizer a ela que vai ficar tudo bem e que o mundo não é tão cruel, eu já sei de cor o horário de visitas, já decorei o endereço, já escolhi a roupa, já penteei o cabelo, já destranquei o cadeado, e ainda assim não fui.
Eu não fui, eu não me perdoo por isso, e não me perdoo por não ter ido vê-la antes, por não ter descrevido a ela como é que se reaprendia a sorrir, eu não me perdoo por poder caminhar na chuva enquanto ela sofre, por poder tomar banho de mar enquanto ela tenta falar, por poder escrever esse texto e não conseguir chegar até o hospital, em que a irmã que eu não visito, sente as dores que eu não conheço, com a inocência que me roubaram desde os tempos em que ela sempre corria pra me abraçar. Tiara sousa

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