sábado, 9 de novembro de 2013

UM FALSO GOSTO POR SOLIDÃO ou PORQUE PREFIRO FICAR EM CASA NUM SÁBADO Á NOITE

Eu sempre falo que gosto de solidão, é tudo mentira, é que eu não gosto da mediocridade de um espaço cheio de pessoas vazias, e às vezes estou extremamente vazia, a ponto de me achar boa demais pra contar estrelas acompanhada.
Porque prefiro ficar em casa num sábado à noite, enquanto as pessoas da minha idade saem para as baladas, para os bares, para as festas, eu penso que tenho um mundo particular, que vivo numa constante ilusão, alimentando a minha fantasia em meio a livros, filmes, discos, internet e TV, e que um dia posso me arrepender de não estar fazendo coisas fúteis com gente mais ou menos interessante. Então, finalmente é sábado á noite, e eu desolada pela ideia de estar deixando a vida passar, me arrumo, ponho o que a geração anos 80 chama de uma roupa descolada, numa tentativa esperançosa de quando sair fazer coisas não fúteis com gente de fato interessante.
A noite começa com uma Coca-Cola, uma garrafa de água, dois cigarros mentolados, duas tentativas de amizade com conhecidas de amigas, de amigas minhas, que em minutos de conversa só sabem falar de como tal cara é gatinho, de como o outro é galinha, de como o som é dez, sendo que ele é no máximo sete, enfim... eu ando meio sem saco pra ser normal, então acho tudo um saco, e achar tudo um saco é ser cem vezes mais triste do que o resto do mundo, além de impedir o inicio natural de amizades.
Mas a noite só está começando, eu ainda irei dançar oito vezes com quatro rapazes diferentes. O primeiro desiste logo na primeira dança, porque tem baixa autoestima e quando percebe que eu não bebo, logo conclui ser mínima a chance de acontecer sexo no fim da noite, e como isso é tudo o que ele quer, distancia-se de mim com mais de mil; O segundo é encantador para os meus padrões, tem uma cara de tonto e um jeito boêmio, vamos dançar algumas vezes e começar a conversar, e ele vai perceber que eu sou mais inteligente do que ele, e isso vai incomodá-lo, então vai passar uma mulher com dez centímetros a mais de bunda do que eu, e com quarenta por cento do quociente de inteligência inferior ao meu, e ele literalmente vai correr atrás dela; O terceiro, que nem me considera assim tão bonita e atraente, ao perceber que dois já dançaram comigo e que não aconteceu nada, supõe que eu seja difícil, e por se achar demais vai querer mostrar a si mesmo que consegue, mas eu tenho meus momentos de futilidade, então mesmo percebendo a situação, vou aceitar dançar com ele, por que ele é lindo para todos os padrões, só que ele se acha demais, ele se acha tanto, mas tanto, que ele não me deixa falar, que ele acha que eu tenho a obrigação de escutar todas as bobagens que ele diz e ainda ficar louca por ele, mas eu já deixei de ter dezessete anos há um bom tempo, e o meu momento fútil tem limite, então eu direi que vou ao banheiro e fugirei do cara mais gato da balada, com a convicção de que ele também é o mais idiota; O quarto é aquele que aparece no fim da noite, enquanto ele se aproxima, penso que ele não me acha nada demais, porque senão teria me convidado pra dançar antes, mas já que ele não ficou com ninguém, e observou que eu não fiquei com ninguém, ele me convida pra dançar, como eu sou educada e numa hora dessas a minha amiga muito menos seletiva, e menos chata, e menos romântica, e menos sensível já vai ter me deixado sozinha e vai estar beijando um cara há horas, vou dançar com ele, e ele até que é fofo, e tem um bom papo, e uma boa aparência, e é até meio inseguro, o que significa que eu posso estar enganada e ele pode não ter se aproximado antes por não saber como, e aí, talvez nos beijemos, e talvez troquemos contatos, e muito provavelmente ele tente transar comigo na mesma noite, mas tudo bem, afinal ele é hetero, jovem e tem hormônios, começa a ficar tudo mal quando ele insisti exaustivamente, como se a minha recusa fosse eu fazendo o tipo mocinha, ou como se eu apenas tentasse prolongar uma situação, e ao perceber que dentro do seu mundo rápido não cabem as minhas ilusões, e que dentro do meu mundo lento não cabem noites sem sentido que não sejam sentimentais, eu vou sair da balada sozinha, sem novos amores, sem novas promessas, sem novos amigos, e vou achar um desperdício de tempo ter saído de casa. Não que eu não tivesse me divertido nem um pouco, mas é que me divertiria muito mais no meu mundo particular.
E antevendo tudo isso, sei que se eu for, eu vou chegar em casa meio que completamente deprimida,  não só por ter passado a noite fazendo coisas fúteis com gente mais ou menos interessante, mas principalmente por saber que no exato momento em que entrar em casa, terei a percepção exata de que é demasiadamente difícil conhecer pessoas realmente interessantes nesses horários e lugares, porque assim como eu, elas devem preferir ficar em casa num sábado á noite, numa constante ilusão, alimentando a fantasia em meio a livros, filmes, discos, internet e TV, porque assim como eu, muitas vezes elas devem pensar que  um dia podem se arrepender de não estar fazendo coisas fúteis com gente mais ou menos interessante, porque assim como eu, muitas vezes elas devem ficar desoladas pela ideia de estar deixando a vida passar.
Então irei desistir de sair, me despirei do que a geração anos 80 chama de uma roupa descolada, vestirei a camisola, colocarei o óculos e aguardarei alguém me ligar pra perguntar porque mais uma vez eu irei preferir ficar em casa num sábado á noite, só para eu poder responder que é porque gosto de solidão, mas eu e muitos sabem, quem não sabe, fica sabendo agora, é tudo mentira, é que eu não gosto é da mediocridade de um espaço cheio de pessoas vazias, e às vezes estou extremamente vazia, a ponto de me achar boa demais pra contar estrelas acompanhada. Tiara Sousa

5 comentários:

Uma nota disse...

Amei esse texto...muito bom mesmo nega!!!

Porque na solidão é cabível a melhor das conversas, os mais intensos suspiros, o maior dos ódios e o preferido amor!

Evoé!!!

Alternativo disse...

Putz, fiquei impressionada com a tua interpretação, tu conseguistes descrever numa frase o que eu passei 1.052 palavras escrevendo. É isso mesmo, é exatamente sobre isso que eu falava. Muito obrigada pelo genial comentário.

Iasmin Carvalho disse...

OMG, que perfeito. Tu escreve mto bem, mulher.
Uma balada dá e tira as esperanças que vc tem de conhecer alguém interessante, e depois dela a solidão parece pior pq parece que se esgotam as alternativas de lugares pra conhecer pessoas interessantes (ainda que só mais ou menos).
Eu sempre fico mto empolga da antes e até meio triste depois uma balada. Que coisa, né? Eu achava que isso acontecia só comigo.

Alternativo disse...

Obrigada Iasmin!!! É isso mesmo, não é só com você que isso acontece, é com muitos de nós, as pessoas verdadeiramente interessantes estão por aí e mais dia, menos dia, nós as encontramos, até lá ainda vamos chegar em casa várias vezes, meio que completamente deprimidas, mas é aí, exatamente nesses momentos que nos tornamos mais interessantes, louco isso né?

Iasmin Carvalho disse...

Mais louco é o jeito que tu sintetizou nesse texto bárbaro hahahaha