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Ele
nasceu nu, nu de corpo, nu de alma, nu de nu. Nus nós nascemos, e assim
conseguimos permanecer por um tempo, mas o primeiro choro, o primeiro riso, a
primeira palavra, a primeira peça de roupa vai nos cobrindo, vai nos poupando
de nos encarar e encarar o outro sem os modos convencionais, a educação formal,
o refinamento, o estilo construído, a superficialidade. Nós só nos cobrimos pra
esconder os males aos quais o mundo nos introduz, os padrões inalcançáveis,
preconceituosos e rasos que nos são impostos, a vergonha que nos é ensinada e
nunca natural, e a Arte quer desconstruir tudo isso. Pois a Arte não quer
cobertas, a Arte derruba as cortinas, a Arte fala mal dos confinamentos, a Arte
é livre. Não sei o que chamam de maldade, de pedofilia, de fim da infância, não
sei, porque o meu coração é comunista, habita na foice e no martelo, tem sede de
igualdade, ás vezes ladra, ás vezes é mordido, não entende de moralismos,
entende de moralidades. E a minha moralidade diz que a nudez é só nudez, tocar
alguém nu, olhar alguém nu, não desperta por si só líbidos, um pênis é apenas
um pênis, todo homem tem, todo bebê do gênero masculino tem, toda criança do gênero
masculino tem, todo o resto é equívoco de mentes promiscuas, de ignorâncias, de
influenciadores que tentam e ás vezes conseguem convencer que um corpo nu é
mais do que apenas um corpo nu.
Aproveitem
esse nosso tempo, esses novos tempos e essa quantidade de informações que nos é
derramada por segundo, e desconstruam e desprendam-se da ideia de que a nudez é
promiscua, não é, não tem que ser, a promiscuidade mora em certas mentes, a
nudez é só um corpo despido, nada mais. Não tentem destruir infâncias com as
suas ideias tolas, ignorantes, preconceituosas e infames. Por favor, meu filho
frequenta redes sociais, então tomem cuidado com o que falam e como julgam, não
destruam a infância do meu filho, dos seus filhos, dos filhos dos seus amigos
dizendo a eles que um corpo nu é mais do que um corpo nu, não é, você tem um corpo
nu, eu tenho corpo nu. Atos de natureza sexual, atos promíscuos, pedofilia,
abuso é outra coisa.
Vocês,
educadores, artistas, trabalhadores braçais, estudantes, façam um favor a vocês
e a sociedade, não comprem essas ideias equivocadas que castram a Arte, que
castram as infâncias, que transformam momentos puros e nus em ideias erronias
de orgia. Estudem, leiam, enxerguem, ouçam, desenvolvam, conheçam, o fato de alguém
estar nu não significa que há algum ato libidinoso, nudez é só um corpo sem
roupas. Se é Arte ou não é, decidam, se apreciam ou não, percebam, se lhes toca
ou não, questionem, mas tenham a certeza que não há promiscuidade num corpo
despido de roupas, estejam certos que a promiscuidade está em vossas cabeças
ignorantes e influenciáveis, e lembrem-se, a Arte é livre inclusive da maldade
e das intenções duvidosas de quem a interpreta de modo incompleto e incoerente.
Há
alguns meses dirigi um monólogo cujo o ator despia-se completamente em uma das
cenas, infelizmente no dia da apresentação meu filho tinha aula e não pôde
comparecer, mas ele assistiu ao ensaio geral, e assistiu outras apresentações artísticas
com nudez, e a infância dele está intacta, lúdica, bela. Sabe porque? Porque ele
nasceu nu, eu nasci nua, você nasceu nu, quando tomamos banho ou nos trocamos,
ou nos secamos estamos nus, e nenhum desses atos tem natureza sexual. São apenas
corpos. É apenas nudez. Tiara Sousa
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