São dez e meia, as horas
ferem, estou cheia de feridas abertas, eu cometo erros, aprendo com eles, me
arrependo, desaprendo, eu os cometo novamente. Eu tenho a minha própria novela,
não preciso ouvir nada que não seja a minha própria fantasia gritando no meio
da rua, não preciso estar em lugar algum que não na minha ilusão, consistente para
mim, inconsistente para o resto do mundo.
Quem quiser ser eu, que se
arrependa, ser eu é habitar nas velhas imagens das cidades que nunca existiram,
é enlouquecer por amores que nunca começaram, é sair dos romances antes de eles
acabarem. Ser eu é amar o silencio, o isolamento, as reticencias... Não posso
falar nada, além do que eu desacredito, a sociedade tem programado seres
desumanos, e eu, humana, nunca me encaixo em nada que não seja a minha própria
fantasia, a minha própria ilusão.
São onze e meia, eu desço as
escadas devagar, eu sempre desço escadas devagar, eu tenho essa mania obsessiva,
compulsiva, ridícula, de sempre achar que eu vou cair, é que eu já cai do céu
tantas vezes, não quero cair novamente. Eu tenho uma carta para entregar para
um futuro amor, que insiste em ficar lá estático, num lugar em que desconheço,
sem código postal.
Eu me prefiro assim com os
dois pés nos chão e a cabeça nas nuvens, eu me prefiro assim chata, e
incomodada, e louca, assim eu sou mais eu e menos real. Eu sempre gostei de
gentilezas e arvores, gente é complicada, gente é fútil, gente é hipócrita,
gente é moralista, gente é vaidosa, as arvores são bem mais confiáveis.
São meia noite e meia, e o
futuro não chega, a responsabilidade não vai, eu tomo um copo de leite e um Amytril,
dormir é covarde, porém não dormir é morrer. Amanhã vou encomendar um sonho pra
eu não ficar mais aqui nesse mundo real e ensurdecedor, com essa musica ruim,
com esse copo de leite, com esse comprimido tarja vermelha para insônia, com
essa insônia, com essas palavras de meia boca e com essa impressão egoísta de que
só eu calo, consinto e enlouqueço.
Quem disse que uma noite de
sono pode mudar uma vida inteira? Eu ainda me iludo com as pessoas, com as
atitudes, com as palavras bem ditas, só não me iludo comigo mesma, tenho
feridas abertas, lágrimas incontidas, sete dias por semana de céu nublado, uma
década de traumas, lapsos de memória, uma biografia de paixões desmedidas.
Portanto, não se iluda comigo rapaz, pare de ligar enquanto há tempo, fuja dos
meus olhos tristes, do meu sorriso tímido, do meu feminismo, dos meus discursos
belos e românticos, pois se pareço coerente, equilibrada e madura, é porque a
minha cartela de Amytril ainda não acabou, mas um dia ela acaba. Tiara Sousa
2 comentários:
Amitil cinco , tegretol cinco, diazepam quatro , amplitctil 1 , socorro!!
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