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Há
dias que não amanhece, que eu passeio de lingerie pelo quarto vazio de olhares
sedentos, sem línguas buscando a minha alma através do meu gosto. Danço tango
sob a minha tristeza, antes eu vagava por olhares que sangravam a fome do mundo
e cujo sangue escorria no meu corpo, agora abdico da fome e da sede com fome e
sede, e me sinto vulgar por sempre ter pensado que todos os sentimentos líricos
eram marginais...
Para
entendê-lo é necessário vagar pelo impreciso com precisão, e admitir ser
cobiçada com alma e sem maldade, com maldade e sem alma, é necessário pluralizar
os mistérios do agora com os do antes e com os do depois e com os do talvez...
E eu não sei não entender.
Para
entendê-lo é necessário calma e fé, verão e inverno, céu e inferno, tudo na
mesma medida, é necessário cegar o mundo e exorcizar crueldades humanamente
desumanas, é necessário tragar um vinho santo, borrar as últimas margens, delirar
entre os versos menos completos e mais profundos... E eu não sei não entender.
Para
entendê-lo é necessário chorar na solidão e pela solidão, ouvir Mozart lendo
quadrinhos, é necessário uma paz distinta e uma guerra velada, e acender velas
para que os santos em que não creio, creiam em mim, em você, em nós... E eu não sei não entender.
Para
entendê-lo é necessário trechos de canções, leitura facial, leitura corporal, é
necessário que todo abraço acolha como o primeiro e despedace como o último, é
necessário virar de um lado para o outro na cama e nunca dormir... E eu não sei
não entender.
Para
entendê-lo é necessário aparecer na multidão sem nunca ser ou fazer parte dela,
é necessário não se encaixar nos hábitos comuns e ser realista de olhos
fechados, e ser sonhadora de olhos abertos... E eu não sei não entender.
Para
entendê-lo é necessário arder com doçura, caminhar sobre as águas, suspirar
entre o fogo e gemer no marasmo, é necessário ser companhia sem ser objeto, ser
dama sem ser passiva... E eu não sei não entender.
Para
entendê-lo é necessário doer com boas maneiras, e eu não sei doer assim, é
necessário cortejar o fundo poço, e eu sempre o temi... E eu preciso entender ainda que doa e
torture, ainda que afague e acalme, ainda que massacre, ainda que termine...
Porque eu não sei não entender... E agora... também não sei mais o que fazer
com o que não entendo...
Te idealizei, não
imaginei o adverso, nunca me dei a esse luxo... e só por isso há dias que não
amanhece, que eu passeio de lingerie pelo quarto vazio de olhares sedentos, sem
línguas buscando a minha alma através do meu gosto... Tiara Sousa
2 comentários:
Eu só não sei não entendê-la!
Sempre há complexidade nas coisas, mesmo elas aparentando simplicidade, não são nada convencionais, nada que imaginamos....tudo soa estranho, mas relaxa..ainda há poesia...isso basta...isso é vida a dois!
rsrs....Adorei o texto...bj nega!
Amei!!! Eu também não sei não entender esse comentário, pois é verdade sempre há complexidades, a simplicidade é uma ilusão, somos todos humanos e a humanidade é intima e estranha, quanto mais intima mais estranha...
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