domingo, 16 de março de 2014

PARA ENTENDÊ-LO...

Direitos da imagem: Gaveta Virtual
Há dias que não amanhece, que eu passeio de lingerie pelo quarto vazio de olhares sedentos, sem línguas buscando a minha alma através do meu gosto. Danço tango sob a minha tristeza, antes eu vagava por olhares que sangravam a fome do mundo e cujo sangue escorria no meu corpo, agora abdico da fome e da sede com fome e sede, e me sinto vulgar por sempre ter pensado que todos os sentimentos líricos eram marginais...
Para entendê-lo é necessário vagar pelo impreciso com precisão, e admitir ser cobiçada com alma e sem maldade, com maldade e sem alma, é necessário pluralizar os mistérios do agora com os do antes e com os do depois e com os do talvez... E eu não sei não entender.
Para entendê-lo é necessário calma e fé, verão e inverno, céu e inferno, tudo na mesma medida, é necessário cegar o mundo e exorcizar crueldades humanamente desumanas, é necessário tragar um vinho santo, borrar as últimas margens, delirar entre os versos menos completos e mais profundos... E eu não sei não entender.
Para entendê-lo é necessário chorar na solidão e pela solidão, ouvir Mozart lendo quadrinhos, é necessário uma paz distinta e uma guerra velada, e acender velas para que os santos em que não creio, creiam em mim, em você, em nós...  E eu não sei não entender.
Para entendê-lo é necessário trechos de canções, leitura facial, leitura corporal, é necessário que todo abraço acolha como o primeiro e despedace como o último, é necessário virar de um lado para o outro na cama e nunca dormir... E eu não sei não entender.
Para entendê-lo é necessário aparecer na multidão sem nunca ser ou fazer parte dela, é necessário não se encaixar nos hábitos comuns e ser realista de olhos fechados, e ser sonhadora de olhos abertos... E eu não sei não entender.
Para entendê-lo é necessário arder com doçura, caminhar sobre as águas, suspirar entre o fogo e gemer no marasmo, é necessário ser companhia sem ser objeto, ser dama sem ser passiva... E eu não sei não entender.
Para entendê-lo é necessário doer com boas maneiras, e eu não sei doer assim, é necessário cortejar o fundo poço, e eu sempre o temi...  E eu preciso entender ainda que doa e torture, ainda que afague e acalme, ainda que massacre, ainda que termine... Porque eu não sei não entender... E agora... também não sei mais o que fazer com o que não entendo...
Te idealizei, não imaginei o adverso, nunca me dei a esse luxo... e só por isso há dias que não amanhece, que eu passeio de lingerie pelo quarto vazio de olhares sedentos, sem línguas buscando a minha alma através do meu gosto... Tiara Sousa

2 comentários:

Uma nota disse...

Eu só não sei não entendê-la!
Sempre há complexidade nas coisas, mesmo elas aparentando simplicidade, não são nada convencionais, nada que imaginamos....tudo soa estranho, mas relaxa..ainda há poesia...isso basta...isso é vida a dois!
rsrs....Adorei o texto...bj nega!

Alternativo disse...

Amei!!! Eu também não sei não entender esse comentário, pois é verdade sempre há complexidades, a simplicidade é uma ilusão, somos todos humanos e a humanidade é intima e estranha, quanto mais intima mais estranha...